Os assassinatos em série e as decapitações no
Complexo Penitenciário de Pedrinhas, no Maranhão, revelam o retorno da
barbárie e uma nova onda de conflitos entre a mais poderosa das
organizações, o PCC, e novas facções na luta pelo controle das prisões
no País. O conflito recrudesceu em razão da expansão do PCC.“Essa organização se espalhou pelo País inteiro. Em vários Estados,
estão surgindo novas facções que não aceitam o comando do PCC e passaram
a matar os detentos a ele vinculados”, afirma o juiz Douglas Martins,
diretor do Departamento de Monitoramento e Fiscalização do Sistema
Carcerário do Conselho Nacional de Justiça (CNJ).Agência BrasilDetentos condenados por crimes contra a pessoa, num universo de 513.713 encarcerados até o final do ano passado, eram 64.736Responsável pelos mutirões carcerários coordenados pelo CNJ, ele se
diz preocupado com o aumento da violência e a banalização de atos
escabrosos. Em alguns casos registrados em Pedrinhas, em plena luz do
dia, num espetáculo macabro, as vítimas são decapitadas e têm os olhos
arrancados.Num dos conflitos registrados este ano em Pedrinhas, os rebelados
aproveitaram a visita de um desembargador maranhense à cadeia e jogaram
em direção ao grupo, rolando como se fosse uma bola, a cabeça de um dos
detentos.As novas facções, mais violentas, estão surgindo em várias partes do
país. Em São Paulo, onde o PCC exerce o domínio de 90% da massa
carcerária, surgiu a Cerol Fino, que disputa os presídios da região de
Presidente Prudente, a oeste da capital paulista. Como o próprio nome
sugere, essa organização tem predileção pela degola das vítimas e busca o
conflito a partir da região onde estão encarcerados os principais
líderes do PCC.Em Pedrinhas, maior palco de violência do sistema penal atualmente –
com 58 homicídios e 13 decapitações registradas este ano – duas
organizações estão se impondo: o PCM (Primeiro Comando do Maranhão) e o
Bonde 40, assim denominada pela preferência de armas de calibre ponto 40
entre seus integrantes. As duas disputam entre si e brigam contra o
avanço do PCC.No Amazonas, especialmente na região de Manaus, surgiu a Família do
Norte, que já matou vários membros do PCC e foi isolada. Na região
metropolitana de Belém, no Pará, a queda de braço está sendo travada por
duas facções cujos apelidos simbolizam o histórico conflito entre
americanos e terroristas que gravitavam em torno de Bin Laden: a Al
Qaeda e Estados Unidos, que se tornaram inimigas mortais.Rio Grande do SulO PCC encontra mais dificuldades para entrar no sistema penal do Rio
Grande do Sul, mas também lá encontrou adeptos, especialmente no
Presídio Central de Porto Alegre, o de maior concentração do país, com
4.800 detentos.O domínio da massa carcerária gaúcha na região metropolitana da
capital pertence, entretanto, a três novas facções: Os Manos, Os Brasas e
Os Balas na Cara. No outro extremo do país, em Salvador, surgiu uma
organização com cara baiana: Comando da Paz.“Os conflitos estão relacionados ao fenômeno da nacionalização do
PCC, que ninguém sabe ainda aonde isso vai dar”, alerta a socióloga
Camila Dias, do Núcleo de Estudos da Violência da USP e autora de
alentado levantamento sobre a hegemonia da organização nos presídios e o
domínio sobre o tráfico de drogas nas grandes cidades.Camila diz que o PCC se firmou como uma grande organização cuja
performance e receptividade na massa carcerária não se explica apenas
pelos serviços sociais internos ou pelos negócios que comanda.“O vetor de ação é um tipo de ideologia onde o inimigo é o estado
violador dos direitos do preso. Acho que é um erro imaginar que se
combate o PCC apenas com apreensão de drogas ou bloqueio dos bens de
seus integrantes”, diz a socióloga. Segundo ela, é contra essa lógica
que as novas organizações se insurgem, repetindo atos de violência que o
PCC abandonou há quase uma década.O juiz Douglas Martins diz que a proliferação de facções reflete o
fracasso do modelo prisional brasileiro, baseado, segundo afirma, na
concentração de detentos em grandes presídios das regiões metropolitanas
e no encarceramento em massa priorizando modalidades ligadas aos crimes
contra o patrimônio.Dados oficiaisOs dados oficiais do Ministério da Justiça, com base no último
levantamento disponível, demonstram que os detentos do país condenados
por crimes contra a pessoa (homicídios e sequestros), num universo de
513.713 encarcerados até o final do ano passado, eram 64.736, enquanto
os contra o patrimônio (roubos, furtos e latrocínios) alcançaram
267.975. Os sentenciados por tráfico de drogas cumprindo pena chegam a
138.198.O grosso da população carcerária do país, 266.237, é formada por uma
juventude com idade inferior a 29 anos. Destes, a imensa maioria
(143.470), está na faixa entre os 18 e 24 anos, é parda (212.409) e
branca (173.463) mora na região metropolitana (211.727), solteiro
(146.481), não completou o ensino fundamental (231.429) e terá de
cumprir pena que varia de quatro a oito anos de prisão (85.784).
Nenhum comentário:
Postar um comentário